Base para o Axé, samba-reggae pode se tornar Patrimônio Imaterial de Salvador com projeto "revivido" na Câmara
- Soteropolitano Notícias
- 12 de abr.
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Foto: Divulgação
A criatura todos conhecem. O criador ainda é incerto mesmo após 40 anos de existência. Mas a essência do Axé Music, um dos maiores movimentos musicais de Salvador, ainda busca um selo importante para o reconhecimento de sua história, como aconteceu para o aniversariante do ano. E o samba-reggae segue nessa caminhada.
Considerada quase como uma das células-mãe do Axé, o samba-reggae, criado na Bahia entre as décadas de 1980 e 1990, por um dos maiores nomes da música estadual, Neguinho do Samba, segue na luta pelo título de Patrimônio Imaterial da Cidade de Salvador.
O gênero teve registrado em 2024 um projeto de indicação na Câmara Municipal de Salvador pelo vereador Silvio Humberto (PSOL). Na proposta, o edil reforça a importância da inclusão do ritmo no patrimônio a ser preservado pelo Estado em parceria com a sociedade.
A indicação de Silvio Humberto chegou a ser encaminhada para supervisão na Comissão de Constituição e Justiça e passou por diversas etapas, antes de ser arquivado em janeiro deste ano. A ida para a gaveta obedece ao artigo 184 do Regimento Interno da Câmara, que ordena o ato de todas as proposições apresentadas na Legislatura anterior que estejam sem parecer ou com parecer contrário das Comissões competentes.
No entanto, em março deste ano, o projeto voltou a ser movimentado. No dia 24, a indicação foi encaminhada a supervisão de tramitação para supervisão de Gestão de Documentos, isto é, ele passa por uma fase de organização e preservação. Como Silvio Humberto se manteve como vereador, o projeto ainda se mantém ativo.
Entende-se por patrimônio cultural imaterial as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas, instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural, e são transmitidos de geração em geração.
Criado por Antônio Luís Alves de Souza, mais conhecido como mestre Neguinho do Samba, o ritmo é uma fusão entre o reggae da Jamaica e o samba, patrimônio cultural do Brasil, que originou uma sonoridade única e cheia de personalidade com o selo soteropolitano.
Entre os principais "embaixadores" do samba reggae estão o Olodum, grupo percussivo que Neguinho fez parte por anos, além de Margareth Menezes, que deu voz a uma das canções mais emblemáticas do gênero, 'Faraó (Divindade do Egito)', composição de Luciano Gomes, primeira música de samba-reggae a ser gravada no país. Entram no rol de divulgadores do gênero nomes como os blocos afro Didá, Muzenza e Ilê Aiyê, além de Carlinhos Brown e Daniela Mercury.

Foto: Arquivo/ Site Carlinhos Brown
Em entrevistas, Neguinho conta que teve como inspiração para o ritmo, além do reggae e do samba, a dança das mulheres do Ilê Aiyê.
"Quando eu vi aquelas coroas [pessoas mais velhas] de 60, 70 anos dançando, aquilo ia me inspirando, a maneira como elas iam dançando, como mudavam os passos, e eu ia fazendo aquilo com o tambor", contou à TV Bahia no ano 2000.
Com formação instrumental que inclui tambores, atabaques, agogô, pandeiro, trazendo a potência da música baiana, o samba-reggae coloca em suas canções a cultura negra no centro, sempre com as expressões de origem africana para dar espaço ao protagonismo de quem é de direito, além de cantar, também, a realidade local, fazendo jus ao ato político que é a arte.
Na dissertação apresentada em 2016 na Ufba pela jornalista e pesquisadora Víviam Caroline, que também é percussionista e cantora no projeto Águas de Sambas, o samba-reggae foi capaz de "possibilitar um novo paradigma musical no país", além de conseguir:
"Se estabelecer como ferramenta de afirmação de uma identidade afro-brasileira incrementando vivências no cotidiano da comunidade e de seus agentes, capaz de rasurar, ratificar e acrescentar novos lugares de fala e de poder não apenas para os sujeitos diretamente afetados pelo processo criativo, mas de toda a cidade que encontra em seus novos processos rítmicos boas chances de evidenciar sua riqueza cultura."
O estilo único da Bahia conquistou não só quem consumia a música de forma local. O samba-reggae ultrapassou as fronteiras geográficas e se tornou apreciado em outros cantos do mundo, sendo associado a nomes como Paul Simon, o primeiro grande nome internacional a levar o Olodum para o mundo; Michael Jackson, que gravou uma versão da música 'They Don't Care About Us' ao lado do Olodum no Pelourinho, além de Jimmy Clif. O samba-reggae também rendeu ao Olodum um exclusivo Grammy na categoria World Music em 1991, e consagrou a criação de mestre Neguinho do Samba no cenário musical internacional.

Foto: Divulgação/ Olodum
"Considerando a importância do registro do Samba Reggae como patrimônio imaterial da cidade de Salvador, com o objetivo de realizar a identificação e produção de conhecimento sobre o bem cultural pelos meios técnicos mais adequados e amplamente acessíveis ao público, permitindo a continuidade dessa forma de patrimônio", pediu Silvio Humberto no documento que propõe o reconhecimento.
A convenção do título de 'Patrimônio Imaterial' dará ao samba-reggae: a salvaguarda do patrimônio; o respeito ao patrimônio cultural imaterial das comunidades, grupos e indivíduos envolvidos; a conscientização no plano local, nacional e internacional da importância do patrimônio cultural imaterial e de seu reconhecimento recíproco; e a cooperação e a assistência internacionais.
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