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Materializar Iemanjá negra é retratação histórica, diz escultor que recriou peça


Foto: Divulgação/Cristian Carvalho

O 2 de fevereiro de 2023 será marcado por uma espécie de reparação histórica ao retratar Iemanjá como uma mulher negra pela primeira vez. No ano do centenário da tradição de ofertar presentes à rainha do mar, a nova escultura da orixá será vista sob uma perspectiva realista de sua representação, fincada na herança afro-brasileira. 

Assinada pelo artista plástico Rodrigo Siqueira, a peça que agora será saudada nos festejos do Rio Vermelho foi recriada por encomenda do Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Muncab), instituição com ênfase na valorização de aspectos da cultura de matriz africana. 


A escultura, que mede 1,40 metro x 60 centímetros, foi concebida em estrutura metálica, com uso de resina, fibra de vidro e talco industrial (pó de mármore). À peça foram acrescidos búzios e conchas do Oceano Pacífico, especificamente da Indonésia.


“Uma sereia negra, a materialização de um orixá tão antigo como Iemanjá, não é só uma reparação. É devolver à senhora do mundo, dona das águas, mãe do mundo, uma história que foi usurpada. Foi roubada pelo colonizador. Estamos falando de 10 mil anos antes de Cristo, e não de 2023 anos.


Então, temos que devolver ao continente africano, aos africanos e às africanas essa origem, o reconhecimento dessa origem”, diz Siqueira ao Varelanet.


“Materializar isso foi realmente uma satisfação, uma vez que Iemanjá é o orixá da minha família biológica: meu avô, minha avó e minha mãe que me pariu são de Iemanjá. Mesmo eu sendo de Obatalá, de Oxanguiã, eu me sinto muito feliz”, descreve o escultor, que confeccionou a nova Iemanjá em seu ateliê no Ilê Oba L'Okê, terreiro do qual é um dos fundadores, em Lauro de Freitas, cidade da região metropolitana de Salvador.

Em 2021, o templo foi declarado Patrimônio Histórico e Cultural do município.


Apagamento histórico


Ao refletir sobre o embranquecimento imposto pelos colonizadores europeus, o artista plástico vê um processo de apagamento histórico que roubou não somente uma riqueza ancestral, mas também se apropriou de símbolos e práticas litúrgicas culturais e religiosas. 


“Quando a gente faz uma peça dessa, não é só para o soteropolitano poder se ver através de uma imagem negra, poder rezar com a beleza de uma imagem negra, mas saber da importância que os nossos ancestrais e os nossos antepassados têm não só para história da cidade de Salvador, mas para a história da humanidade”, afirma Siqueira..Ele acrescenta: “Fazer uma escultura negra é, sim, poder fazer uma reparação histórica e comemorar muito com essa comunidade, que se organiza de uma forma muito árdua todos os anos para colocar esse presente nas águas”.


Oferendas: agradecimento por saúde e fartura


Perfumes, flores, sabonetes e espelhos são alguns dos itens presentados à Iemanjá. Tradição que remonta ao ano de 1923, o gesto nem tão ecologicamente sustentável é o momento de expressar gratidão à rainha das águas. 


“O presente de Iemanjá nas águas é uma forma de agradecer e fazer com que Iemanjá continue nos devolvendo toda a fartura, toda consciência, toda inteligência. Por isso que muitas comunidades de terreiro falam ‘que Iemanjá possa nos dar, tal qual tem as areias e as estrelas do céu, em saúde, em alegria, em fertilidade, em abundância, em dinheiro frio e fresco”, explica.


“É muito sábio poder utilizar e reusar essas palavras dos nossos antigos para que isso se perpetue no sentido mais amplo dessa palavra”, enfatiza Siqueira. 


Quem é Iemanjá?

Iemanjá, também conhecida como Janaína, Inaê ou Princesa de Aiocá, é uma orixá cultuada em religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda — crenças com origem na África. 

No Brasil, sua figura é representada por mulher com traços e pele branca, vestido azul e longos cabelos pretos, ora com enfeites de peixes e conchas, visto que é a rainha do mar.


O nome Iemanjá vem da junção de três palavras da língua iorubá, idioma tradicional da região onde hoje fica a Nigéria: yèyé (mãezinha), omo (filho) e eja (peixe) e por isso ela é a "mãe cujos filhos são peixes". Em outras palavras, uma divindade dos mares, como explica o livro "Yorubá: vocabulário temático do candomblé", de Márcio de Jagun.

Odoyá!


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